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terça-feira, 3 de novembro de 2015

A CASA DE ASTÉRION


A CASA DE ASTÉRION


E a rainha deu à luz um filho que se chamou
Astérion.
APOLODORO: Biblioteca, III, I.

Sei que me acusam de soberba, e talvez de misantropia, talvez de loucura. Tais acusações (que castigarei no devido tempo) são irrisórias. É verdade que não saio de minha casa, mas também é verdade que suas portas (cujo número é infinito)estão abertas dia e noite aos homens e também aos animais. Que entre quem quiser. Não encontrará aqui pompas femininas, nem o bizarro aparato dos palácios, mas sim a quietude e a solidão. Por isso mesmo, encontrará uma casa como não há outra na face da terra. (Mentem os que declaram existir uma parecida no Egito.) Até meus detratores admitem que não há um só móvel na casa. Outra afirmação ridícula é que eu, Astérion, sou um prisioneiro. Repetirei que não há uma porta fechada, acrescentarei que não existe uma –, fechadura? Mesmo porque, num entardecer, pisei a rua; se voltei antes da noite, foi pelo temor que me infundiram os rostos da plebe, rostos descoloridos e iguais, como a mão aberta. Já se tinha posto o sol, mas o desvalido pranto de um menino e as rudes preces da grei disseram que me haviam reconhecido. O povo orava, fugia, se prosternava; alguns se encarapitavam no estilóbato do templo dos Machados, outros juntavam pedras. Alguém, creio, ocultou-se no mar. Não em vão que foi uma rainha minha mãe; não posso confundir-me com o vulgo, ainda que minha modéstia o queira.

O fato é que sou único. Não me interessa o que um homem possa transmitir a outros homens; como o filósofo, penso que nada é comunicável pela arte da escrita. As enfadonhas e triviais minúcias não encontram espaço em meu espírito, que está capacitado para o grande; jamais guardei a diferença entre uma letra e outra. Certa impaciência generosa não consentiu que eu aprendesse a ler. Às vezes o deploro, porque as noites e os dias são longos.

Claro que não me faltam distrações. Como o carneiro que vai investir, corro pelas galerias de pedra até cair no chão, atordoado. Oculto-me à sombra de uma cisterna ou à volta de um corredor e divirto-me com que me procurem. Há terraços de onde me deixo cair, até me ensangüentar. A qualquer hora posso brincar que estou dormindo, com os olhos fechados e a respiração forte. (Às vezes durmo realmente, às vezes já é outra a cor do dia quando abro os olhos.) Mas, de tantas brincadeiras, a que prefiro é a de outro Astérion. Finjo que ele vem visitar-me e que eu lhe mostro a casa. Com grandes reverências, digo-lhe: "Agora voltamos à encruzilhada anterior" ou "Agora desembocamos em outro pátio" ou "Bem dizia eu que te agradaria o pequeno canal" ou "Agora verás uma cisterna que se encheu de areia" ou " lá verás como o porão se bifurca". As vezes me engano e os dois nos rimos, amavelmente.

Não só criei esses jogos; também meditei sobre a casa. Todas as partes da casa existem muitas vezes, qualquer lugar é outro lugar. Não há uma cisterna, um pátio, um bebedouro, um pesebre; são catorze [são infinitos] os pesebres, bebedouros, pátios, cisternas. A casa é do tamanho do mundo; ou melhor, é o mundo. Todavia, à força de andar por pátios com uma cisterna e com poeirentas galerias de pedra cinzenta, alcancei a rua e vi o templo dos Machados e o mar. Não entendi isso até que uma visão da noite me revelou que também são catorze [são infinitos] os mares e os templos. Tudo existe muitas vezes, catorze vezes, mas duas coisas há no mundo que parecem existir uma única vez: em cima, o intrincado sol; embaixo, Astérion. Talvez eu tenha criado as estrelas e o sol e a enorme casa, mas já não me lembro.

Cada nove anos, entram na casa nove homens para que eu os liberte de todo o mal. Ouço seus passos ou sua voz no fundo das galerias de pedra e corro alegremente para procurá-los. A cerimônia dura poucos minutos. Um após o outro, caem, sem que eu ensangüente as mãos. Onde caíram, ficam, e os cadáveres ajudam a distinguir uma galeria das outras. Ignoro quem sejam, mas sei que um deles profetizou, na hora da morte, que um dia chegaria meu redentor. Desde esse momento a solidão não me magoa, porque sei que vive meu redentor e que por fim se levantará do pó. Se meu ouvido alcançassem todos os rumores do mundo, eu perceberia seus passos. oxalá me leve para um lugar com menos galerias e menos portas. Como será meu redentor? – me pergunto. Será um touro ou um homem? Será talvez um touro com cara de homem? Ou será como eu?

O sol da manhã reverberou na espada de bronze. Já não restava qualquer vestígio de sangue.

– Acreditarás, Ariadne? – disse Teseu. – O minotauro mal se defendeu.


A Marte Mosquera Eastman.



BORGES, Jorge Luis. O Aleph. Tradução de Flávio José Cardozo. São Paulo: Globo, 1999. Título Original: El Aleph.

sábado, 25 de maio de 2013

So Long and Thanks for All the Fish


Encontraram um espaço na grama, relativamente livre de casais deitados um em cima do outro, sentaram-se e observaram os patos espetaculares e a luz do sol ondulando na superfície do lago que corria sob os patos espetaculares.

– Uma história – disse Fenchurch, aconchegando o braço dele no dela.

– Que vai te dar uma idéia do tipo de coisa que acontece comigo. É completamente real.

– Você sabe que algumas vezes as pessoas contam histórias que supostamente aconteceram com o melhor amigo do primo da sua mulher, mas que, no fim das contas, foram inventadas mesmo.

– Bom, parece mesmo uma dessas histórias, só que realmente aconteceu e eu sei que aconteceu, porque a pessoa com a qual tudo aconteceu fui eu.
– Como o bilhete da rifa.

Arthur riu.

– Exatamente. Eu ia pegar um trem – prosseguiu ele. – Cheguei na estação...

– Eu já te contei – interrompeu Fenchurch – o que aconteceu com os meus pais numa estação?

– Já – disse Arthur.

– Só estou conferindo.

Arthur deu uma olhada no relógio.

– Acho que já podíamos voltar – disse ele.

– Conte a sua história – respondeu ela, decidida. – Você chegou na estação.

– Eu estava uns vinte minutos adiantado. Confundi o horário do trem. Acho que é no mínimo igualmente possível – acrescentou, após uma breve reflexão – que a companhia de trens tenha confundido o horário. Nunca tinha pensado nisso.

– Tá, continua. – Fenchurch riu.

– Aí eu comprei um jornal, para fazer as palavras cruzadas, e fui até o restaurante para tomar um café.

– Você faz palavras cruzadas?

– Faço.

– Quais?

– As do The Guardian, normalmente.

– Eu acho que eles sempre tentam ser espertinhos. Prefiro a do Times. Você resolveu?

– O quê?

– As palavras cruzadas do Guardian.

– Ainda não tive chance de dar uma olhada nelas – disse Arthur. – Ainda estou tentando comprar um café.

– Tudo bem, então. Compre o café.

– Estou comprando. Estou comprando também alguns biscoitos.

– Que tipo?

Rich Tea.

– Boa escolha.

– Também gosto. Com tudo isso em mãos, eu procuro uma mesa e me sento. E, antes que você me pergunte como era a mesa, não sei, não lembro, isso aconteceu há séculos. Provavelmente era redonda.

– Tá bem.

– Deixa eu recapitular a cena. Eu lá, sentado à mesa. A minha esquerda, o jornal. À direita, o café. E no meio da mesa o pacote de biscoitos.
– Estou vendo perfeitamente.

– O que você não vê – disse Arthur -, porque ainda não o mencionei, é um cara que já estava sentado nessa mesa. Ele está sentado na minha frente.

– Como ele é?

– Perfeitamente normal. Maleta de couro. Terno e gravata. Não tinha cara de quem estava prestes a fazer uma coisa estranha.

– Ah. Conheço bem esse tipo. O que ele fez?

– Ele fez o seguinte. Ele se inclinou sobre a mesa, pegou o pacote de biscoito, abriu, pegou um e...

– E?

– Comeu.

O quê?

– Ele comeu.

Fenchurch olhou para ele, abismada.

– E que diabos você fez?

– Bem, diante das circunstâncias, fiz o que qualquer inglês viril faria. Fui obrigado a ignorá-lo.

– Como assim? Por quê?

– Bom, não é o tipo de coisa para a qual a gente está preparado, né? Vasculhei minha alma e descobri que não havia nada na minha criação, experiência ou até nos meus instintos básicos me dizendo como reagir diante de alguém que, sentado na minha frente, simplesmente, calmamente, rouba um dos meus biscoitos.

– Ah, você podia... – Fenchurch pensou a respeito. – É, tenho que admitir que eu teria feito a mesma coisa. E aí, o que aconteceu?
– Concentrei furiosamente a minha atenção nas palavras cruzadas – disse Arthur. – Não consegui preencher nada, tomei um gole de café, estava quente demais para beber, então eu não tinha nada para fazer. Me preparei. Apanhei um biscoito, tentando fingir que não tinha reparado que o pacote já estava misteriosamente aberto...

– Mas você reagiu, adotou uma postura firme.

– Do meu jeito, sim. Comi o biscoito. Comi deliberada e ostensivamente, para que ele não tivesse dúvida sobre o que estava fazendo. E, quando eu como um biscoito – disse Arthur -, devo dizer que não tem volta.

– E o que ele fez?

– Apanhou outro. Sério – insistiu Arthur -, foi exatamente o que ele fez. Ele apanhou outro biscoito e comeu. Tão claro como a luz do dia. Tão certo como estarmos sentados aqui no chão.

Fenchurch mexeu-se desconfortavelmente.

– E o problema – disse Arthur – é que, como eu não havia dito nada da primeira vez, ficou ainda mais difícil levantar o assunto da segunda vez. O que eu poderia dizer? "Com licença... não pude deixar de notar que..." Não dava mais. Não, eu o ignorei, até mesmo com mais vigor do que antes
– Esse é o meu homem...

– Olhei para as palavras cruzadas, novamente, não consegui fazer uma linha, aí, inspirando-me na coragem de Henrique V no Dia de São Crispim...

– Ahn?

– Eu ataquei novamente. Peguei outro biscoito. E, por um momento, os nossos olhos se encontraram.

– Assim?

– Sim, bem, não, não desse jeito. Mas se encontraram. Por um breve instante. E nós dois desviamos o olhar. Mas devo dizer – disse Arthur – que houve uma pequena eletricidade no ar. Havia uma pequena tensão crescendo naquela mesa. Àquela altura.

– Imagino.

– Acabamos com o pacote assim. Ele, eu, ele, eu.

– O pacote todo?

– Bom, eram só oito biscoitos, mas parecia que toda uma vida de biscoitos havia se passado diante de nós. Nem mesmo os gladiadores enfrentavam algo tão difícil.

– Os gladiadores – disse Fenchurch – teriam que fazer tudo isso sob um sol forte. Exige mais do condicionamento físico.

– É, tem isso. Enfim. Quando o pacote vazio jazia morto entre nós, o cara finalmente se levantou, já tendo feito o pior e foi embora. Eu suspirei aliviado, é claro. Anunciaram o meu trem um pouco depois, então terminei o meu café, levantei, apanhei o jornal e, embaixo do jornal...

– Ahn?

– Estavam os meus biscoitos.

– O quê? – perguntou Fenchurch. – O quê?

– É sério.

Ela ficou sem ar e se jogou de costas na grama, morrendo de rir.

Sentou-se novamente.

– Seu bobalhão – disse ela, levantando a voz -, seu bobo, tolo e completo idiota!

Empurrou Arthur para trás, rolou sobre ele, lhe deu um beijo e rolou de volta ao seu lugar.

Ele ficou impressionado ao sentir como ela era leve.

– Agora é a sua vez de me contar uma história.


ADAMS. Douglas. Até mais, e obrigado pelos peixes! Tradução de Márcia Heloísa Amarante Gonçalves. São Paulo: Arqueiro, 2010, p. 76-80. Título Original: So Long, And Thanks for All the Fish.


domingo, 30 de dezembro de 2012

O Sangue do Ombro de Pallas





Por Daniel Dreiberg

O Texto a seguir é reimpressão do Jornal da Sociedade Ornitológica Americana, outono de 1983.
 
 
Será possível estudar um pássaro tão de perto, observar e catalogar suas peculiaridades em detalhes tão minuciosos, que o mesmo se torna invisível? Será possível que, enquanto medimos fastidiosamente a envergadura de suas asas ou o comprimento de seu tarso, acabamos perdendo a visão de sua poesia?

Será possível que, em nossas prosaicas descrições de plumagens marmóreas ou vermiculadas, perdemos a visão de pinturas vivas, uma sucessão de tons de marrom e dourado que envergonharia Kandinsky ou explosões de luz e cor à altura de Monet? Eu creio que sim. Acredito que, ao estudarmos nosso objeto com a sensibilidade de um estatístico ou de um dissector, nós nos distanciamos cada vez mais das maravilhas e encantamentos da imaginação.

sábado, 1 de setembro de 2012

A Patrulha da Noite


Em suas Crônicas de Gelo e Fogo, o autor norte-americano George R. R. Martin concebeu A Patrulha da Noite, no original Night's Watch, como uma Ordem militar responsável pela segurança dos Sete Reinos de Westeros.

Em muitos momentos durante a leitura dos livros da saga, a comparação com os Cavaleiros Templários é quase inevitável. Afinal, assim como os integrantes da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão (do latim Ordo Pauperum Commilitonum Christi Templique Salominici), os Patrulheiros da Noite são celibatários e não possuem bens.

Ouso dizer que a associação aos Templários só é amortecida quando, bem mais adiante, o leitor trava conhecimento com as ordens monásticas militares dos Filhos do Guerreiro e dos Pobres Irmãos que, por motivos óbvios, se parecem ainda mais com os Templários. Os Filhos do Guerreiro são cavaleiros que renunciam toda riqueza e aos prazeres da carne para juramentar suas espadas à Fé. Eles usavam mantos arco-íris e armadura embutida de prata por cima de cilícios, e trazem cristais em forma de estrela nos botões do punho das espadas. Por seu turno, Os Pobres Irmãos formam uma irmandade mendicante cujos membros trazem consigo machados de guerra e passam o tempo a correr pelas estradas, escoltando viajantes de septo em septo. O seu símbolo é a estrela de sete pontas, vermelha sobre branco. O povo simples chama aqueles de Espadas e estes de Estrelas.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Keep Calm and Carry On



Não sei bem se nos últimos meses ou semanas, o antigo cartaz motivacional produzido pelo governo britânico em 1939 se espalhou de tal forma pela internet que muitas pessoas, que, alias,já viram quase todas as múltiplas versões produzidas por milhares, quiçá milhões, de internautas, não sabem como tudo começou.

Antes de virar meme, antes de viralizar, a mensagem Keep Calm and Carry On fez parte de uma série de cartazes que o Ministério da Informação, antecipando os dias difíceis que viriam pela frente, concebeu logo no início do conflito que viria a ser conhecido como a Segunda Guerra Mundial.

Assim, em 1939, visando aplacar as fortes tensões sociais de um território que, em pouco tempo, se tornaria um dos principais alvos dos bombardeios alemães, as mensagens foram criadas e começaram a ser difundidas para elevar o moral da população inglesa.

Inicialmente eram três cartazes, em verdade bastante simples, todos com a mesma tipologia, uma fonte facilmente reconhecível e ao mesmo tempo difícil de ser copiada pelo inimigo, confeccionados em apenas duas cores e ostentando uma frase de impacto, que tem como pedra angular a coroa britânica, do então Rei George VI.

domingo, 17 de junho de 2012

Febre de Bola de Nick Hornby



O Turbilhão Nervoso

Em Febre de bola encontramos divertidas partículas da experiência universal do futebol. O jogo que domina as mentes de milhões de seguidores e fãs pelo mundo. O esporte que, em larga medida, ignora as fronteiras naturais e, sobretudo, as fronteiras erigidas pelo homem. Em todos os continentes as crianças correm atrás da bola e lançam suas bobinadas certeiras enquanto gritam os nomes de seus heróis. A magia, o espetáculo, a paixão do futebol. Tantos são os adjetivos e as fórmulas utilizadas na tentativa de explicar o sentimento “sem nome” do futebol. Porém – máxima ironia – o senhor Nick Hornby, a seu modo, resolveu explicar isso tudo escrevendo um livro sobre ele mesmo.

Exatamente, conforme um grande amigo afirmou, Febre de Bola não é um livro sobre o futebol. Fever Pitch é o título original desse livro em que o autor relata momentos de sua vida entre 1968 e 1992, tendo como pano de fundo o futebol. Na verdade, posso dizer que vai um pouco além disso: o futebol para Hornby é muito mais do que um simples cenário, o futebol é a sua obsessão.

O autor tinha 13 anos de idade quando o mundo da bola se desvelou diante de seus olhos. A separação dos pais, justo naquela época, e as complicações próprias da aurora da adolescência são os ingredientes que transformaram a alma do autor em um campo fértil para o florescimento de uma paixão avassaladora, uma fuga, uma obsessão: o futebol.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

As origens da queda do absolutismo


Não raras fontes históricas defendem que a monarquia francesa encontrou seu fim ao pé do cadafalso e, segundo essas mesmas fontes, a expressão máxima de sua derrocada teria ocorrido em 21 de janeiro de 1793, quando o povo francês decapitou seu Rei, o monarca Luis XVI. Munro Price [1] lembra que antes desse evento dramático, a monarquia era uma estrutura grandiosa, malgrado todas as suas rachaduras, e o rei que, por fim, ficou uma cabeça menor governava por Direito Divino, sendo responsável por suas ações apenas diante de Deus.

Antes de prosseguir, é bom que se diga que cortar a cabeça de um rei não era novidade na Europa, pois em 1649, a Câmara dos Comuns criou uma corte (Tribunal de Exceção? Sim, claro) para promover o julgamento de Carlos I. Assim, no dia 29 de janeiro daquele mesmo Ano do Senhor de 1649, Carlos I foi condenado à morte por decapitação e – celeridade a toda prova –, decapitado já no dia seguinte, do lado de fora da Banqueting House.

Ao matar um rei, portanto, não significa acabar com a monarquia. Mesmo porque, na França, ao contrário do que ocorrera antes da Inglaterra, houve a Revolução. Segundo M. J. Roberts [2], a Revolução Francesa compreende conjunto de eventos ocorridos entre 5 de maio de 1789, com a convocação dos Estados Gerais e a famosa Queda da Bastilha e 9 de novembro de 1799, com o 18 de Brumário de Napoleão Bonaparte.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Os Nove da Fama



Os Nove da Fama são os nove príncipes legendários que personificam os ideais da cavalaria, quiçá a maior de todas as instituições humanas da Idade Média. No idioma de Denis Diderot, eles são chamados de Les Neuf Preux, que em tradução livre (e não menos literal) poderia soar como “os nove valentes”,  termo que passa uma ideia mais precisa do tipo de virtude moral que foi considerada para a escolha daqueles soldados que passariam a ser sinônimo dos elevados ideais cavaleirescos. Na Itália eles são conhecidos como Nove Prodi. Em inglês o termo utilizado para designá-los é Nine Worthies.

Os escolhidos compõem três grupos triádicos orientados pelas religiões que professaram: três gentios (Heitor, Alexandre e Júlio César); três judeus (Josué, Davi e Judas Macabeu); e três cristãos (o Rei Arthur, Carlos Magno e Godofredo de Bouillon).

Esses grandes cavaleiros representam todas as facetas do guerreiro perfeito. Com exceção de Heitor e Arthur, todos são heróis conquistadores. Aqueles que não eram príncipes vieram de famílias da aristocracia. No universo da cavalaria seus predicados e suas virtudes são reconhecidas por sua atemporalidade e universalidade. Todos trouxeram glória e honra para suas nações, e foram conhecidos por sua habilidade pessoal nas armas. Individualmente, cada um exibia alguma qualidade excepcional que os tornou o modelo de cavaleiro.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Até quando, Catilina?




Marcus Tullius Cicero nasceu em Arpino, por volta de 106 a.C. Passou à História como uma das mentes mais atiladas da antiga Roma. Sua versatilidade fez com que seja ainda hoje reconhecido como grande advogado, orador sublime, político, magistrado, filósofo, linguista e tradutor.

Ana Teresa Marques Gonçalves [1], que elaborou estudo da obra De Legibus de Cícero [2] afirma a família do grande orador pertencia à ordem equestre, de maneira que, para ascender à ordem senatorial, Cícero foi submetido a uma cuidadosa e criteriosa educação.  Sabe-se que Cícero foi Questor na Sicília em 76 a. C. e Edil Curul em 70 a. C. No ápice de sua carreira política, Cícero foi Cônsul da República, mas foi degredado em 58 a.C.

Júlio César concedeu a anistia a Cícero que voltou a Roma. Sendo, inclusive, durante  a Ditadura de César que ele produziu várias de suas obras. Contudo, no período conturbado que se seguiu desde a morte de César até a ascensão de Otávio Augusto ao trono, o autor de De re publica foi morto a mando e a soldo de Marco Antônio, que em um gesto ao mesmo tempo bárbaro e simbólico mandou pregar as mãos que haviam escrito às novas Filipicas [3], juntamente com a cabeça, na rostra no Fórum Romano, o habitat natural de Cícero, local onde provavelmente proferiu as Catilinárias, as célebres orações acusatórias contra Catilina que ainda hoje ecoam mundo a fora.

domingo, 15 de abril de 2012

Napoleão: Máximas e Pensamentos, de Honoré de Balzac



O Moderno Prometeu

A primeira edição de “Napoleão: Máximas e Pensamentos” não apontava Honoré de Balzac como autor do prefácio e organizador, pois o célebre autor de “Le Lys dans la vallée”, precisando saldar alguns compromissos com seus credores, vendeu o livro a um certo J. L. Gaudy Jeune pela importância de 4 mil francos.

É, de fato, bastante curioso pensar em um dos maiores escritores de todos os tempos como uma espécie de ghost writer do século XIX. O equivalente moderno do “melhoro sua monografia” ou algo do gênero. A história, porém, aconteceu realmente. Balzac trabalhou árdua e incessantemente durante toda a vida para dar à luz sua vastíssima obra, era, para utilizar um termo em voga, um workaholic inveterado, movido a grandes doses de café forte, mas sempre passou por dificuldades financeiras. Quando ele nasceu, em 1799, Napoleão acabava de regressar do Egito para, após o 18 de Brumário, se tornar Cônsul da República Francesa ao lado de Ducos e Sieyès. O autor de “Ilusões Perdidas”, portanto, cresceu sob a influência do Fazedor de Reis. Como se sabe, nem mesmo a derrota sofrida em 1815 e o consequente exílio em Santa Helena, onde o Imperador morreu em 1821, tiveram o condão de enfraquecer o mito napoleônico. Muito pelo contrário, pois foi justamente durante a Restauração que a já legendária figura do Artilheiro de Toulon ascendeu ao quase sagrado.