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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

The Motherland Calls


Espaço, tempo e os elementos drenaram a força e a vitalidade do agressor. Ao invadir a Rússia, a Alemanha penetrou num clima diferente, e seus exércitos precisaram lidar com mudanças de estação repentinas e violentas. A estratégia alemã da guerra-relâmpago era inadequada para operações continuadas, e os rigores do inverno de 1941 surpreenderam o profeta da Nova Ordem. Quando chegou o frio, este matou mais soldados alemães do que as balas e baionetas russas. No entanto, seria equívoco presumir que o xeque-mate sofrido por Hitler, superando em muito as perdas de Napoleão de Moscou, deveu-se apenas a uma mudança do clima. Foram os sacrifícios dos russos que conseguiram isso – o que não muda a conclusão de que seis semanas de tempo clemente poderiam ter feito diferença para o maior ataque militar de todos os tempos. Mas o general inverno, o eterno aliado da Santa Mãe Rússia, não permitiu. (Erik Durschimied. Como a natureza mudou a História. Rio de Janeiro. Ediouro: 2004, p. 226-227.)
A historiografia relata que o solo sagrado da Mãe Rússia jamais foi expugnado pelo inimigo estrangeiro. Carlos XII da Suécia marchou sobre a Rússia no bojo da Grande Guerra do Norte em 1707. O rei sueco conquistou importantes vitórias, porém, seu exército encontrou a aniquilação em Poltava, marcando, assim, o fim da trajetória da Suécia como uma grande nação européia. Napoleão, por seu turno, chegou a tomar Moscou e passar uma noite no próprio Kremilin, porém, a desastrosa retirada sob o látego impiedoso do General Inverno solapou as bases do Primeiro Império Francês, uma vez que a fina flor da soldadesca francesa pereceu sob toneladas de gelo. O último a tentar foi Hittler. O último a fracassar também. Erik Durschmied, em seu revelador Como a Natureza Mudou a História, cujo breve excerto transcrevemos acima à guisa de epígrafe da presente exposição, relata como os temidos Panzers congelaram e afundaram na lama, perecendo sob a pesada mão do General Inverno, o mesmo que um século e meio antes havia subjugado o Vencedor de Austerlitz.

Nada obstante, hoje em dia muito se fala da decisiva Vitória dos Aliados na Segunda Guerra Mundial, do Dia D, quando a maior armada que o mundo já vira tomou as desoladas areias de Omaha Beach. Para os russos, porém, a Segunda Guerra não foi uma vitória do bem contra o mal nazi-fascista. Antes, para os russos, não houve uma simples vitória dos aliados sobre os alemães. Para esses renitentes cossacos, o que houve foi uma vitória do povo russo. Todos na Rússia, do mais jovem e ignaro estudante até o mais encanecido ancião, sabem que a Segunda Guerra é a grande vitória russa.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Ecos do Front



E as pessoas não nos compreenderão, pois, antes da nossa, cresceu uma geração que, sem dúvida, passou estes anos aqui junto a nós, mas que já tinha um lar e uma profissão, e que agora voltará para suas antigas colocações e esquecerá a guerra... e, depois de nós, crescerá uma geração, semelhante à que fomos em outros tempos, que nos será estranha e nos deixará de lado. Seremos inúteis para nós mesmos. Envelheceremos, alguns se adaptarão, outros simplesmente resignar-se-ão e a maioria ficará desorientada; os anos passarão e, por fim, pereceremos todos. (Erich M. Remarque. Nada de Novo no Front. São Paulo. Abril: 1981, p. 230-231.)


Quem o vê agora, esquecido de todos e de tudo à sua volta, corpo alquebrado pelo acúmulo de dias, carcomido pelas escaras, não diria estar diante de um combatente. Distinções de bravura foram muitas. O batismo de fogo foi na Itália, em Monte Castelo, onde ele e seus camaradas, para o bem da humanidade e da democracia, colocaram os chucrutes para correr. Muitos dos camaradas que o acompanharam nessa jornada épica não voltaram para suas famílias e para seus negócios no Brasil. Todos os que regressaram, porém, na medida do possível, tiveram cá suas honrarias: um simples lenitivo, uma vez que o tributo de sangue não é o único exigido dos heróis das grandes epopéias. Os mortos do campo de batalha e o horror da guerra cobram o preço definitivo da lembrança, marca indelével que distingue os que foram testemunha da demonstração cabal da intolerância. A guerra não é senão a máxima expressão da maior de todas as misérias humanas.

Voltou outro do front, os seus logo notaram a mudança: o olhar perdido sempre a fitar o vazio, a confusão do pensamento, os pesadelos que jamais o deixaram em paz. Agora suas forças o abandonaram e nada representa, relegado aos maus tratos de enfermeiras ineptas, financiadas com o minguado soldo que ainda recebe. A doença grassou de pouco em pouco, como num cerco, conquistando pequenas vantagens dias após dia, mas, enquanto pôde, ele ostentou uma independência orgulhosa, posto que falsa. Antes do fim, viu-se que tudo não passava de vã ilusão. Agora havia um primo distante que administrava o curto estipêndio, não oferecia nenhum suporte emocional, mas pelo menos garantia que um teto lhe cobriria a cabeça nos últimos dias que inexoravelmente se aproximavam.